segunda-feira, 17 de maio de 2010

Era uma vez... uma peça de Shakespeare

Troilo e Créssida


O que está em jogo, aqui, na guerra de Tróia são, nada mais, nada menos, que querelas entre um cornudo orgulhoso (Menelau) e uma puta que se deu a um troiano (Helena).



 O TMA – Teatro Municipal de Almada – apresenta pela primeira vez em Portugal a peça Troilo e Créssida, da autoria de William Shakespeare, uma peça contemporânea de Hamlet datada de 1623 – aliás, encontramos mesmos algumas reminiscências de Hamlet no herói troiano Troilo.

 Joaquim Benite, director do Teatro Municipal de Almada, e José Martins são os encenadores desta peça que se situa entre o drama e a farsa – cabe ao espectador no final decidir para qual dos lados mais se inclina.

 Tendo como pano de fundo a guerra entre gregos e troianos, consequência do rapto da ‘ bela’ Helena, esposa de Menelau, por Páris, a peça conta-nos uma história de guerra, de política, de amor e de pragmatismo.

 Aqui vemos heróis que idealizávamos fortes de carácter e robustos de corpo, transformados em personagens hipócritas de bravura corrompida, o que se manifesta na aparência exterior. O amor de Troilo e Créssida não se aproxima minimamente do de Romeu e Julieta – Créssida resgata o pragmatismo de uma mulher, podemos dizer, contemporânea – inteligente, prática, audaz (mas nada heróica). Já Helena, que poderíamos equiparar a uma espécie de Julieta, é uma personagem pequena que não deve favores à inteligência nem à perspicácia. Páris e a hipocrisia andam de mãos dadas. Troilo, apesar de amar ardentemente, é detentor de uma inoperância amorosa. Aquiles é encarnado por um personagem gordo e careca – é um orgulhoso sem emenda que se faz sempre acompanhar da sua “puta masculina”, Pátrocolo. Ajax é um pobre acéfalo que pensa que é alguém. Ulisses é mais um político corrompido, bem como muitos outros. Vai-se safando o Idiota, que sem a censura e a parcialidade a que outros estão fadados nos vai aludindo num tom jocoso acerca de verdades da situação.

 É uma peça que recomendo. Foi escrita por Shakespeare como analogia à guerra anglo-espanhola. Toca em vários géneros teatrais, de conteúdos umas vezes mais sérios, outras mais descontraídos. A sátira é um elemento sempre presente apesar da peça ser considerada dramática.

 Praticamente sem cenários mas a jogar com poderosos efeitos de luz e fumo, é criado na peça um espantoso efeito cénico. A sonoplastia, em termos de ruídos de fundo, apesar de não tão excelente, também é recomendável. O guarda-roupa, ideia muito original – troianos trajam negro e gregos beje – sem roupa de época, com indumentária simples dos nossos dias. Quanto aos diálogos, estes são, como seria de esperar, tremendamente cativantes.

 Concluindo, daria como nota final um muito bom. Peça que desmistifica o heroísmo que muitas vezes se disfarça de interesse.

 Além disso, faz-nos ainda questionar: será que a vádia da Helena vale uma guerra sanguinolenta? Mas não vos preocupeis se sois adeptos dos grandes amores e achais a história de Páris e Helena um belo romance: parece que afinal a galdéria da Helena era apenas uma desculpa, o que os Gregos queriam era destruir Tróia e iam fazê-lo com puta ou sem puta.

"p.s" - isto não merecia estar num simples ps, mas esqueci-me de mencionar anteriormente e acho relevante - a prestação dos actores é muito boa, assim como a peça. Destacaria o Bobo, personagem que me deixou especialmente deliciada com a sua actuação.

4 comentários:

David19 disse...

Acho que não há muita coisa a dizer sobre esta peça para além do... ESPETACULAR!!!! Também quero ir ver lool adoro shakespeare e então com influências da epoca classica melhor ainda, simplesmente tenho de ir ver ;D

Catarina Lopes disse...

Terás de te deslocar a Almada, mas vale a pena :)

daniela disse...

aw q crueldade perante o romance de Helena e Páris :(
boa crítica. gostava de saber da tua opinião sobre a actuação em si

Catarina Lopes disse...

lapso de amadora nestas andanças, lol - A actuação é muito boa, uns encantam mais que outros obviamente, mas no computo geral a nota é muito positiva: destacaria a personagem do Bobo - que é absolutamente brilhante.